sábado, 31 de dezembro de 2011

Tio Faz Cista


Não venha novamente com palavras toscas,
Não me deixe às moscas, não me azucrine
Pois só você vê crime no meu reclamar.

Eu cansei do jeito do teu preconceito,
Enjoei de nojo da tua mente estreita
Pois só você na espreita tenta me emboscar.

Olha que eu ateio fogo na tua burrice,
Vê se te liberta de tanta tolice
Que eu rasgo tua roupa e mostro teus sinais.

E antes que o céu desabe na minha cabeça
Vou rasgar bandeiras, vou tirar as listras
Pois o azul só quer o branco-verde-ouro
E nunca o vermelho que nos arranca o couro
E nos faz escravos do seu Tio Faz Cista.

Voltas


quanto mais eu ando
mais descalço eu
faço o laço e
desfaço e
caço.
Sô !
Pô !
Saco !
Cavaco !
Quanto caco !
Mais descalço eu
piso o chão que ando,
mais estrepe pica meu casco
mais espinho fura meu pé.
Quanto mais eu corro
mais sou cachorro,
latindo eu morro,
peço socorro,
esporro,
urro.
Ré.
Pé ?
Sapé ?
Como é ?
Quanta fé !
Exportaram meu café
e pra comer importaram rapé.
Quanta terra sob tão pouco pé !

Um dia comum


Vou vadio rua acima,
Mãos nos bolsos, cabeça vazia.
Rua acima vou vazio.

Num dia azedo, desço a avenida tragando fumaça.
Os rostos que passam cruzam comigo,
Olhares se ligam, bocas caladas.

Na porta do boteco fechado
Vou contando garrafas de leite
Deixadas ao lado.

Passo bares e lojas ainda fechados.
O cigarro no fim eu apago
Deixando-o cair no chão, no asfalto.

Vou vadio rua acima,
Olhos fixos no nada,
No nada vou vazio.

Paro no pau colorido.
O ônibus faz força querendo subir.
Eu subo, piso nos pés alheios, quase caio.

O ônibus cheio sacode a moçada
Que calada se deixa sacudir
Até a última parada.

Descem barbudos e bigodudos,
Homens mudos e surdos,
Tenho vontade de rir.

Joguei fora o chiclete e parei,
O ponto é final e eu cansei,
Agora vou me deitar.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011


Roupas  


A roupa suja desnuda a fome que assola
O homem que a roupa veste.
A roupa rasgada retrata calada a ventura
Do homem que a farda veste.
E nada pode mudar estas constatações.
Nada pode rasgar por dentro o que por for é roto.

Eu sou assim. Somos um todo.

A roupa limpa veste o homem que nu não passa de
Um homem que vestido pensava que era Deus.
A roupa cobre pelo pudor e descobre pelo amor.
Então é inútil cobrir.
A vida é a roupa da morte que depois de um corte
Já não serve a ninguém.
O corpo é um pedaço de alma que sem ele ainda
É alma e sempre será.

A roupa veste o corpo todo mas não deixa o corpo
De ser peste que contamina a alma.
A roupa que cobre o nu descobre a vaidade
E na morte, na eternidade, mofa, e se descose.
Ofuscar



E a chama se propaga
Cada vez maior.

E a grama embriaga
Cada vez mais.

O que os olhos não mostram,
O que a luz ofusca.

O rei



O rei chegou ontem do seu reino.
Atravessou outros reinos em luta viril contra seus reis.
Venceu combates violentos, perdeu mulheres na cama
E enterrou seu pai.

O rei cavalgou solitário entre florestas,
Colheu violetas dos amores que esqueceu.
Foi torturado e esquartejado,
Juntou seus pedaços e fugiu até chegar aqui.

Bebeu água salobra e comeu, só por comer,
A carne dos que venceu.
Com seu cavalo vermelho cavalgou suado de sol
E se alucinou com o canto da coruja.

O rei voltou vitorioso da batalha,
Deixou seus inimigos e fugiu até chegar aqui.
Trouxe a coroa debaixo do braço,
Cortou-se nas axilas com o aço do seu bisturi.

O rei chegou ontem do seu reino.
Está entre nós, no nosso reino e vai fugir outra vez.

sábado, 6 de agosto de 2011

O caminho da paz

Olhos firmes na mira, o alvo é fácil,
Brincadeira de criança.
E cai mais um bastardo.
Ninguém ampara o corpo morto.
É estudante ? É operário ?
Questionam os jornais, os padres os policiais,
Os menestréis.

A bandeira é tingida de vermelho.
Não o ideológico, não o comunista.
Mas o biológico, o vermelho sangue, o vermelho vida.

Caminham uniformes prepotentes,
Baionetas balançando na cintura.
Olhos firmes na mira, brincadeira de idiotas, patriotas.

Escudos protetores, opressão da ganância.
Anseiam poder e riquezas,
Das profundezas da carne ao espírito.

Cai mais um no asfalto.
Olhos firmes no céu.
Buscava a liberdade, buscava a paz.
Brincava de ser gente, morreu réu.